A propaganda do governo de Jair Bolsonaro (PSL) de que a reforma da Previdência era necessária para combater privilégios é desmentida com uma matemática simples que demonstra que os mais pobres vão pagar a conta.
Um exemplo é o trabalhador que conseguiu contribuir com o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) por 20 anos (tempo mínimo necessário para a aposentadoria com as novas regras) e está a poucos meses de se aposentar por idade, aos 65 anos.
Antes da reforma da Previdência, ele receberia 90% dos 80% maiores salários de contribuição. Com a reforma vai receber apenas 60% da média geral. Dependendo do valor de contribuição ao longo desses anos, ele vai perder mais de 30% do benefício. Ou seja, se ele ia se aposentar com R$ 2.000,00 vai receber, no máximo, R$ 1.400,00.
A diferença de R$ 600,00 é maior do que o custo hoje de uma cesta básica em São Paulo, calculada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) em R$ 473,85 por pessoa – o equivalente a 51,6% do valor do salário mínimo (R$ 998,00).
Se pensarmos numa família de quatro pessoas, dois adultos e duas crianças este valor chega a R$ 1.419,00. Isto significa que a aposentadoria desse trabalhador não vai dar para pagar, sequer, a alimentação mínima necessária para ele, sua mulher e seus dois filhos, ou ainda, netos, já que é muito comum nas famílias brasileiras o aposentado ser o provedor da casa, em função das altas taxas de desemprego que o país vem enfrentando.
“O governo Bolsonaro não está economizando R$ 800 bilhões com a reforma da Previdência. Ele está tirando dinheiro do consumo, da população, dos mais pobres que não vão mais receber este dinheiro. São valores que poderiam melhorar a qualidade de vida da população”, afirma a técnica da subseção do Dieese/ CUT Nacional, Adriana Marcolino.
A Previdência reduziu a pobreza de 25,6 milhões de pessoas. Essas pessoas não estão na pobreza por causa da aposentadoria que recebem- Adriana Marcolino
A perda no valor da aposentadoria para uma trabalhadora também terá um impacto muito grande no sustento de uma família. São 28,9 milhões de famílias brasileiras chefiadas por mulheres em 2015, ano dos últimos dados, segundo a pesquisa Mulehres Chefes de Família no Brasil: Avanços e Desafios", da Escola Nacional de Seguros, publicada em março deste ano.
Outro estudo da Fundação Getúlio Vargas, baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgado em maio deste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que as mulheres apontadas como pessoa de referência na família representavam 45% dos domicílios do país.
“Se levarmos em conta que uma trabalhadora que teria direito a se aposentar aos 60 anos de idade com 15 anos de contribuição receberia 80% das suas melhores contribuições, e com a reforma vai receber apenas 60% da média geral, a perda para o sustento de uma família é de no mínimo 20%. É um dinheiro que fará falta no fim do mês”, diz Marcolino.
A diminuição no valor do benefício na velhice, ou num momento mais vulnerável de um trabalhador acidentado, que também não vai mais receber os 100% do que teria direito, e da viúva e dos órfãos que terão reduzido o valor da pensão, vai trazer somente aumento da pobreza, acredita a técnica do Dieese.
“Diminuir a capacidade de consumo, de renda, de bem estar da população, é uma catástrofe social”, critica.
Para Adriana Marcolino, a dificuldade de se aposentar com as novas regras da Previdência, de aumento do tempo de contribuição e a diminuição do valor do benefício podem fazer ainda muita gente desistir de contribuir com o INSS.
“Uma parte dos trabalhadores não vai conseguir se aposentar e nunca irá ver a cor desse dinheiro que teria direito pelo trabalho que realizou ao longo da vida”, conclui.