Durante os dias 30 de setembro e 1 de outubro, a Fundacentro, fundação vinculada ao governo federal que elabora estudos e pesquisas sobre a saúde no ambiente de trabalho, segurança e medicina do trabalho, promoveu o Seminário Nacional de Prevenção ao Suicídio e Trabalho, que contou com a participação de especialistas de várias áreas para debater esse tema sempre tão sensível nas relações pessoais e profissionais.
Conforme dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade, em 2022 o Brasil registrou 16,4 mil óbitos por suicídio, em todo o mundo, mais de 700 mil pessoas cometeram o ato final de suas vidas. Portanto, abordar esse tema sem qualquer estigma é uma necessidade sempre presente. Os dois dias de seminário estão disponíveis no canal da Fundacentro no Youtube.
A diretora do Sindicato dos Psicólogos de São Paulo (Sinpsi) e membra do Conselho Nacional de Saúde, Fernanda Magano, participou de duas mesas abordando as políticas públicas voltadas para a prevenção do suicídio. No primeiro dia, Magano dividiu a mesa com Márcia Oliveira, assessora do Departamento de Saúde Mental, Álcool e Drogas, do Ministério da Saúde, e Deivisson Santos, docente do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal, que abordaram diversos aspectos da problemática.
A Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, instituída pela Lei n° 13.819/2019 tem por objetivo promover a saúde mental, prevenir a violência autoprovocada; pesquisar e conhecer os fatores determinantes e condicionantes da saúde mental; promover a articulação intersetorial para a prevenção do suicídio e garantir o acesso à atenção psicossocial das pessoas com histórico de ideação suicida.
Povos originários: suicídio ou genocídio
Na tarde do segundo dia de seminário, a mesa composta por Rogério Giannini, presidente do SinPsi, Fernanda Magano, Ana Paula Guljor, presidente da Abrasme (Associação Brasileira de Saúde Mental) e Norian Segatto, jornalista do SinPsi e diretor de Saúde da Federação Nacional dos Jornalistas, apresentaram o tema “Sofrimento mental e vulnerabilidade em trabalhadores da saúde”. A dra. Elaine Marquese fez uma apresentação virtual mostrando uma revisão bibliográfica sobre o tema.
Rogério começou sua intervenção apresentando uma fala da psicóloga e indígena Nita Tuxá, que questionou se os chamados suicídios dos povos originários não se trata de mais uma face perversa do genocídio praticado desde a invasão europeia no Brasil.
Na sequência, Giannini fez uma linha do tempo histórica da “evolução” dos modelos capitalistas para demonstrar que as condições de trabalho atuais não diferem muito de 200 anos atrás, quando a dita revolução industrial utilizava trabalhadores em condições, insalubres sem qualquer direito, fazendo extensas jornadas de trabalho e recebendo misérias. “Se esse quadro se parecer com a atual condição de muitos trabalhadores de aplicativos, não é mera coincidência”, disse o presidente do SinPsi.
Ana Guljor buscou o mote levantado por Nita Tuxa para aprofundar o debate sobre a política de aniquilamento dos povos originários, mas também advertiu que o sofrimento mental e suicídio entre trabalhadores da saúde também estão relacionadas à divisão social do trabalho. “O sofrimento de um técnico de enfermagem na pandemia era um sofrimento real, imediato, corpo a corpo. Eu sou psiquiatra e podia atender online, mas o técnico de enfermagem que cuidava dos meus usuários no tratamento intensivo não tinha como ser online”, destacou a presidente da Abrasme.
Norian Segatto apresentou princípios éticos e editoriais que a mídia utiliza (ou deveria utilizar) para tratar o tema. Ele citou um caso emblemático ocorrido em 1993, quando o jornal Folha de S.Paulo estampou em sua primeira página e deu matéria de página inteira do brutal suicídio de uma jovem estudante de Direito. A reação ao sensacionalismo da matéria foi tamanha, que a partir dali a imprensa passou a ter em seus manuais instruções específicas de como abordar o tema. No ano 2.000, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou uma cartilha com orientações para a cobertura jornalística do tema.
Fernanda Magano, sempre com apresentações recheadas dos ensinamentos da Mafalda, personagem de quadrinhos criada pelo cartunista argentino Quino, desta vez trouxe o Armandinho, personagem criado por Alexandre Beck. Ela expôs as diversas iniciativas tomadas pelo Conselho Nacional de Saúde e pelo governo, os equipamentos de saúde mental e a necessidade de se olhar para os diversos aspectos da saúde, do trabalho decente e dos direitos humanos na busca de políticas públicas mais eficazes.
Ela destacou, ainda, a necessária triangulação entre instituições e ministérios para ações mais assertivas, em que trabalhadores sejam ouvidos e cuidados. Como medidas de prevenção, ela defendeu o tratamento adequado dos transtornos mentais; restrição de acesso a métodos potencialmente perigosos; capacitação da sociedade para identificação e abordagem a pessoas em risco; e fortalecimento de fatores de proteção, como vínculos sociais, habilidades de resolução de problemas, expressão emocional.