O resultado de pesquisa sobre relações de trabalho realizada pelo Instituto Datafolha, assim como a matéria em si, a começar pela sua manchete, e divulgado em 22/6/2025, pelo jornal Folha de São Paulo, é claramente tendencioso.
Ao ler a matéria com olhar critico se pode perceber o interesse de quem conduziu a pesquisa e ainda na elaboração do texto tendo em vista desqualificar a CLT.
Afirmar que 59% dos entrevistados dizem preferir trabalhar por conta própria a ter emprego registrado implica em submeter esse resultado a um olhar mais abrangente e também crítico para que se entenda melhor a questão e não simplesmente se possa aceitá-lo tal como fora publicado.
Será que, ao fazer esse tipo de afirmação, essas pessoas demonstraram compreensão sobre o que é de fato trabalhar por conta própria? Possuíam clareza sobre as dificuldades de se montar um negócio e fazê-lo prosperar? E mais: demonstraram o necessário discernimento sobre ser um trabalhador ambulante, autônomo (sem CNPJ), ou Microempreendedor Individual (MEI), qual a sua real fonte de renda, sua jornada diária de trabalho e quantos dias por semana tem que trabalhar para obter uma renda minimamente digna? Duvido que a pesquisa tocou nesses assuntos.
Por outro lado, responsabilizar programas de transferência de renda como sendo responsáveis pelo desinteresse dos jovens em relação ao emprego, mesmo que com carteira assinada, é covardia pois nenhum estudo sério comprovou até agora essa hipótese.
Se de fato é isto por que nada tem sido dito sobre quais são os direitos, o valor dos salários e demais benefícios que as empresas oferecem que sirvam de estimulo às novas contratações? Ademais, é preciso tornar claro que, se benefícios existem estes se devem à luta dos sindicatos, através da negociação coletiva, incluindo a utilização da greve, que é um direito, nunca por vontade dos patrões.
Se a rigidez do trabalho é um dos problemas apontados pela pesquisa que impedem novas contratações então por que as empresas não aceitam discutir com seriedade o fim da escala 6X1 e a redução da jornada semanal de trabalho de 44 horas, uma das maiores no mundo, para 36 horas (sistema 4X3), tal como proposta em emenda à Constituição (PEC), de autoria da deputada Erika Hilton/Psol/SP, a tramitar no âmbito do Congresso Nacional onde os patrões possuem representação parlamentar majoritária?
Quando se afirma que a culpa é da CLT, e não a maneira como ela vem sendo descontruída naquilo que é do interesse dos trabalhadores, porém mantida os pontos e aspectos que interessam aos patrões, é de um tendenciosismo covarde, desprezível.
No tocante à rigidez do trabalho (gestões patronais impositivas) e ainda as longas e estafantes jornadas, os baixíssimos salários, são fatores desestimulantes para a maioria que está empregada mesmo com carteira registrada. A meu ver as principais causas do abandono do emprego, do desinteresse por uma vaga e a procura por outras atividades que se considera menos penosas.
Cumpre ressaltar que a visão, que é patronal, de um dos entrevistados pela Folha, sobre “crescer a pressão para redução dos encargos trabalhistas, o que facilitaria que as empresas paguem mais para atrair trabalhadores” traz em si uma profunda contradição. Aliás, em grande medida a redução de direitos é a causa do já referido desinteresse pois em regra não oferece perspectiva alguma e sim sofrimento. Logo, não é a CLT a culpada. Ao assegurar direitos trabalhistas, a CLT contribuiu para a construção de uma sociedade econômica e socialmente mais equilibrada na qual os trabalhadores passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos e não apenas como mão de obra.
Desde quando no Brasil a redução de direitos implicou em aumento salarial? Desde quando as empresas transferiram algum ganho a mais aos trabalhadores senão quando, por meio das suas respectivas representações sindicais, eles se mobilizam, negociam e/ou fazem greve?
A aprovação da terceirização (Lei nº 13.429/2/2017) e da contrarreforma trabalhista (Lei 13.467/11/2017), além de outras medidas, ajudou e muito nessa crise do emprego pois aprofundou a precarização dessas relações em vez de melhorar as condições de trabalho e de renda. Isto não se deu por acaso, mas financiada pelos patrões na sua ânsia por lucros cada vez maiores a baixo custo.
O que vemos hoje é uma massa de trabalhadores, especialmente jovem, recusando-se a adentrar, mesmo com carteira assinada, ao universo das empresas, vez que não enxerga futuro nessa forma de contratação. A patrãozada e seus prepostos não se corrigem nunca!