Artigo - Tarifaço é novo golpe para a indústria brasileira

A indústria nacional está prestes a sofrer um ataque externo sem precedentes. Graças a uma decisão arbitrária e unilateral do presidente norte-americano, Donald Trump, produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos terão uma taxa de 50% a partir de 1º de agosto. O tarifaço vale para todos os setores – indústria, agropecuária, comércio e serviços.

Conforme estudo da CNI (Confederação Nacional da Indústria), o PIB do País pode recuar 0,16% se a sobretaxa não for reduzida ou cancelada. Os EUA respondem por 12% das exportações do Brasil e por 16% das importações. No caso da indústria de transformação, 78,2% das exportações vão para o mercado norte-americano. Tanto na metalurgia quanto no segmento de máquinas e equipamentos, o principal destino dos nossos produtos são os EUA.

São Paulo deve ser o estado mais prejudicado, com queda de R$ 4,4 bilhões no PIB. Na sequência, aparecem Rio Grande do Sul (R$ 1,9 bi), Paraná (R$ 1,9 bi), Santa Catarina (R$ 1,7 bi) e Minas Gerais (R$ 1,6 bi). Entre as empresas do setor industrial com mais risco de perdas, estão a Embraer, a WEG, a Tupy, a Suzano, a Jalles Machado e a Fras-Le/Randon.

A conta da irresponsabilidade de Trump pode cair nas costas dos trabalhadores. Se as projeções da CNI estiverem corretas, o tarifaço deve provocar o fechamento de 26 mil postos de trabalho apenas na indústria.

A tarifa de 50% é mais um golpe sofrido por um setor que há tempos perde participação na economia brasileira. Em 50 anos, a indústria brasileira sofreu com as crises do petróleo e da dívida, a “estagflação” da década de 1980, o avanço do neoliberalismo, as recessões, a crescente concorrência chinesa, a “doença holandesa”, as altas taxas de juros, a operação Lava Jato e, mais recentemente, os governos entreguistas de Temer e Bolsonaro.

Com a volta de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, em 2023, o Brasil passou a articular ações integradas, em parceria com o Poder Público e a iniciativa privada, para tentar reverter a desindustrialização. Projetos como a NIB (Nova Indústria Brasil), o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e o Mover (Programa de Mobilidade Verde e Inovação) são exemplos dessa diretriz.

Vamos lembrar: em anos de bolsonarismo e pandemia de Covid-19, o País viveu uma fuga de fábricas. O caso do fechamento das plantas da Ford, como a de Camaçari, foi o mais emblemático.

Lula, com sua palavra – mas, sobretudo, com ações –, conseguiu recuperar a confiança do setor. Não foi por acaso que, entre 2023 e 2024, a indústria automotiva anunciou investimentos que, somados, chegam a R$ 130 bilhões – ou a R$ 136,5 bilhões, se incluirmos o segmento de autopeças. Em complemento, o Brasil estreitou relações com os países emergentes que compõem os BRICS, sobretudo a China. Nossa disposição é a de manter boas relações com todas as nações, inclusive os EUA.

“O Brasil sempre esteve aberto ao diálogo”, afirmou Lula em recente pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV. “Fizemos mais de dez reuniões com o governo dos EUA e encaminhamos, em 16 de maio, uma proposta de negociação. Esperávamos uma resposta – e o que veio foi uma chantagem inaceitável, em forma de ameaças às instituições brasileiras, e com informações falsas sobre o comércio entre Brasil e EUA.”

Se as projeções da CNI estiverem corretas, o tarifaço deve provocar o fechamento de 26 mil postos de trabalho apenas na indústria

Com o objetivo de impedir o tarifaço, Lula designou o vice-presidente Geraldo Alckmin para liderar as tratativas com os Estados Unidos. Alckmin também é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, tendo mantido uma importante interlocução com o setor produtivo. Desde que assumiu as negociações sobre as taxas de 50%, ele já se reuniu com mais de cem representações empresariais, além das centrais sindicais. Há um importante pacto “antitarifaço” em curso no País, que vai além de eventuais divergências políticas, econômicas ou ideológicas.

Não estão claras as motivações reais de Donald Trump para elevar as tarifas sobre produtos brasileiros. Na carta em que anunciou o tarifaço, ele alegou déficit nas relações comerciais com o Brasil e mencionou discordância com a postura firme do nosso Judiciário nas ações contra a quadrilha golpista de Bolsonaro e as todo-poderosas “big techs”, as gigantes de tecnologia. A primeira razão é falsa – os Estados Unidos são superavitários no comércio bilateral. A segunda razão não passa de ingerência em assuntos internos, que seguem à risca a Constituição e o Estado Democrático Direito.

Uma semana depois desse anúncio, Trump abriu investigações sobre supostas “práticas desleais” do Brasil. O Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos citou o Pix, o comércio popular na Rua 25 de Março e falhas no combate à corrupção e ao desmatamento. A tentativa de ingerência, sem base legal, só se agravou. Desde quando os EUA determinam a forma de pagamento que os brasileiros devem usar? Quem é Trump para falar em respeito às leis e à ordem? Como um país que acaba de sair do Acordo de Paris (sobre mudanças climáticas) quer ensinar algo sobre desenvolvimento sustentável?

Nos últimos dias, especulou-se que a Casa Branca estaria interessada nos minerais críticos e estratégicos do Brasil, como nióbio, grafite, níquel e lítio, além das terras raras. O governo Lula deve lançar em breve o programa Mineração para Energia Limpa, uma política nacional de minerais críticos, a fim de reforçar a soberania nacional nessa área e pôr esses minerais a serviço da reindustrialização.

A gestão federal acerta em não ceder à chantagem. Em visita a Minas Gerais, na quinta-feira passada (24), Lula lembrou que o Brasil tem em seu território – e precisa proteger – “12% da água doce do mundo”, petróleo, ouro e minerais ricos. “Aqui ninguém põe a mão. Este país é do povo brasileiro”, concluiu o presidente.

Esta é uma batalha da qual o movimento sindical não pode ficar de fora – até porque seus impactos recaem sobre a classe trabalhadora. O sindicalismo deve abraçar a luta em defesa da indústria e da soberania nacional, contra o imperialismo e pelo crescimento com desenvolvimento. A sentença que dá título de um livro do economista Paulo Nogueira Batista Jr. resume o que está em jogo: “O Brasil não cabe no quintal de ninguém”.


Alex Custodio
Presidente da Fitmetal (Federação Nacional de Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil) e do Sindicato dos Metalúrgicos de Betim e Região, além de membro da direção nacional da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil)

 

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