O cenário geopolítico global ferve em uma ebulição que remete às grandes inflexões da história. Desde o pós-Guerra de 1945, o mundo tem orbitado em torno de uma ordem unipolar, com os Estados Unidos como força hegemônica incontestável. No entanto, essa hegemonia, outrora sólida, contorce-se em resistência diante do avanço inexorável de uma nova ordem econômica multipolar, cujo nome – BRICS – ecoa com crescente ressonância nos corredores do poder mundial. Não se trata apenas de uma reacomodação de forças, mas de um embate profundo que aponta para um salto qualitativo em direção a uma nova arquitetura político-social global.
A ontogenia dessa transição remete a uma compreensão mais profunda das dinâmicas que moldaram o século XX. Se, como propôs Karl Marx, as contradições inerentes ao sistema capitalista impulsionam sua transformação, a hipermodernidade – marcada por um consumo desenfreado e uma globalização financeira liderada pelo Ocidente – parece ter chegado a um ponto de saturação. Os reflexos das crises econômicas, a ascensão de novas potências e a crescente interconexão global, paradoxalmente, revelam as fissuras de um sistema concebido para beneficiar poucos.
A gênese do BRICS, inicialmente um acrônimo para Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e agora expandido para incluir novos membros, representa mais do que uma aliança econômica; ele encarna a promessa de uma ordem multipolar respeitosa à soberania das nações e cooperativa no desenvolvimento econômico. É um movimento que busca reequilibrar a balança de poder, promovendo um modelo de governança global que não se baseie na imposição, mas na colaboração mútua, na sustentabilidade da vida e na construção de um Novo Humanismo planetário. Essa busca por uma nova ética global ressoa com as ideias de Edgar Morin sobre a complexidade e a necessidade de uma reforma do pensamento, que transcenda os compartimentos disciplinares e promova uma visão mais holística do mundo.
A recente imposição de sanções punitivas ao Brasil pelos EUA é um sintoma claro desse embate. Longe da narrativa de “equilíbrio econômico” ou de “taxas mais justas”, essas ações desvelam uma confrontação que se sustenta em diferenciais epistêmicos fundamentais sobre o futuro do mundo. Não é um diálogo econômico que se busca,é um recado aos países do BRICS uma tentativa de manter e continuar impondo um paradigma . Essa dinâmica corrobora a visão de Humberto Maturana sobre a autopoiese dos sistemas vivos: os EUA, como um sistema autopoiético da velha ordem, tentam manter sua identidade e organização, reagindo a qualquer perturbação que ameace sua estrutura. As sanções são, nesse sentido, uma tentativa de coaptar ou eliminar – os elementos percebidos como desestabilizadores – do sistema que se pretende manter.
A Inflexão Histórica e a Passagem à Pós-Modernidade
Estamos, de fato, vivenciando um momento de inflexão histórica. A Hipermodernidade, caracterizada pela aceleração, pela centralidade da tecnologia e pela busca incessante por mais, alcançou seus limites. O avanço “quântico” da tecnologia, ao invés de apenas otimizar o antigo, exige um novo paradigma epistêmico. Essa demanda por uma coerência que permita a autopoiese da passagem histórica para a Pós-Modernidade é o cerne da questão. A Pós-Modernidade, nesse contexto, não é apenas um estilo ou uma fase cultural, mas a necessidade de uma nova forma de organização social e política que incorpore a complexidade, a interdependência e a busca por um propósito maior.
A transição, como em qualquer sistema vivo, exige a eliminação dos “catabólitos” do velho e a predominância do “anabolismo” do novo. Os resquícios de uma mentalidade belicista, de competição predatória e de uma visão antropocêntrica dissociada da natureza precisam ser superados. O “anabolismo” do novo se manifesta na busca por soluções coletivas para desafios globais, na valorização da diversidade cultural, na promoção da justiça social e ambiental e na construção de pontes de cooperação.
Trump e o “Case” Brasil: Um texto com todos elementos da agenda oculta do governo Estadunidense
O “case” exemplar dos últimos acontecimentos entre os EUA e o Brasil, sob a ótica abusiva do presidente Donald Trump, é emblemático para os reais interesses desses movimentos. As sanções com alíquota de 50% de taxa para importações brasileiras não tem nada de equidade importações x exportações, a investida se dá no campo de seu interesse de manter subordinação politica da soberania nacional.
Trump, com sua retórica de “América Primeiro” e sua abordagem unilateral, representa para muitos o velho paradigma a ser eliminado ou transformado. Seu mandato simbolizou a tentativa de reverter a globalização e reafirmar uma soberania nacionalista em detrimento da cooperação multilateral.
Contudo, a própria intensidade da resistência que sua política gerou e as fissuras que expôs no sistema global demonstram a urgência da mudança. A possibilidade de um Estado Americano reciclado, capaz de adaptar-se e integrar-se a essa nova ordem multipolar, é crucial para o bem-estar de todos. Essa “reciclagem” não implica anulação, mas uma reinvenção de seu papel em um cenário onde a interdependência é a chave.
A crise atual é, portanto, uma oportunidade histórica para sermos militantes contemporâneos desse confronto, conscientes de que o desfecho determinará a qualidade de vida das próximas gerações. É o momento de cultivar uma “massa crítica” consciencial suficiente para o salto qualitativo que o nosso ciclo histórico exige, da Hipermodernidade para a Pós-Modernidade, forjando um futuro mais equitativo, cooperativo e sustentável.