A comoção nacional gerada pela recente morte de quatro policiais e mais de uma centena de civis no Rio de Janeiro vai além do luto. Ela acende um alerta vermelho sobre a eficácia e os rumos das políticas de segurança pública no Brasil. Tragédias como esta são sintomas de um modelo falido, que insiste em tratar a violência com mais violência, ignorando suas causas profundas.
Lamentamos profundamente as mortes desses profissionais, que, em sua maioria, vêm de origens humildes e ingressam na corporação em busca de estabilidade e propósito. Eles foram enviados para uma missão de alto risco que, infelizmente, não contribuirá para uma mudança estrutural. Foram usados para sustentar uma narrativa de combate que ignora as raízes do problema, em tabuleiro onde só há peões e quem move as peças nunca sangra.
O Caminho da inteligência: A lição da Operação Carbono Oculto
Enquanto operações tradicionais, marcadas por tiroteios e mortes, dominam as manchetes, um novo paradigma de sucesso silencioso foi implementado recentemente com resultados históricos. A Operação Carbono Oculto, considerada a maior investida contra o crime organizado na história do país, serve como exemplo incontestável.
A operação, que atingiu em cheio uma extensa rede de financiamento do PCC, não disparou um único tiro, não resultou em mortes e, no entanto, foi devastadoramente efetiva. Ao mirar 350 pessoas e empresas em oito estados, a ação desarticulou as finanças do crime, com um valor de tributo sonegado superior a R$ 7,5 bilhões.
O segredo do sucesso? A integração. A Carbono Oculto foi a consolidação de três grandes operações anteriores, agora coordenadas sob uma lógica de sinergia entre Polícia Federal, Receita Federal, Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Ministérios Públicos e órgãos estaduais. Foi uma vitória da inteligência, da análise de dados e da cooperação institucional sobre a pura força bruta.
Repensar o modelo: do confronto à investigação
A lição deixada pela Carbono Oculto é clara: o combate mais eficiente ao crime organizado no século XXI não ocorre necessariamente nas vielas das comunidades, mas nos meandros dos sistemas financeiros e nas bases de dados dos órgãos de controle. A estratégia de “invadir e confrontar” repetidamente os mesmos territórios, além de custar vidas valiosas de servidores da segurança e de civis, mostra-se incapaz de causar um dano permanente às organizações criminosas, que se reestruturam rapidamente.
É urgente repensar o modelo político. Precisamos valorizar e investir massivamente nas carreiras de inteligência e investigação, equipando nossos servidores com tecnologia e estrutura para que possam desmontar o crime por sua raiz: o dinheiro. A operação que prende um ‘gerente financeiro’ do tráfico é infinitamente mais estratégica do que aquela que mata dez ‘soldados’ na base da pirâmide”.
O caminho apontado por especialistas e pela própria experiência de sucesso no país é o de fortalecer a capacidade estatal de atuar de forma cirúrgica e inteligente. É garantir que os servidores públicos da área de segurança não sejam meros peões em um jogo político, mas sim agentes transformadores, protegidos e capacitados para construir uma paz duradoura, baseada não no extermínio, mas na justiça e no Estado de Direito. A vida, de todos, deve ser o princípio e o fim de qualquer política pública.