Um movimento de participação popular sem precedentes marcou as Audiências Públicas do Plano Plurianual (PPA 2026-2029) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO 2026) na Câmara dos Vereadores de São Paulo. Pela primeira vez na história recente das discussões orçamentárias do Legislativo, o tema da Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa mobilizou, no dia 31 de outubro, a sociedade civil a ponto de lotar não apenas um mas dois auditórios da Casa, transformando a etapa legislativa em um verdadeiro fórum de controle social.
Com uma população estimada em cerca de 2,5 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, a maior metrópole da América Latina viu seus cidadãos mais experientes saírem da “invisibilidade orçamentária” para se colocarem, de forma articulada e contundente, no centro do debate sobre a alocação de recursos públicos.
“Examinamos uma série documental por meio da execução orçamentária entre 2003 a 2023 e só encontramos 46 mil ações dedicadas aos idosos. Sabe o que significa? A invisibilidade. Precisamos romper esta visão de Estado.” — Diz um trecho de manifestação similar feita em audiência na Câmara Municipal de São Paulo, segundo relatos de imprensa.
Intensa participação
A intensa participação não foi fruto do acaso. Por trás da lotação dos plenários e da apresentação das reivindicações, encontra-se uma meticulosa estratégia de controle social liderada por uma Frente de ativistas dos fóruns de Idosos e entidades de defesa dos direitos das pessoas idosas de São Paulo em parceria com o Conselho Municipal da Pessoa Idosa de São Paulo (CMI-SP).
Os representantes organizados estiveram presentes em todas as audiências, com um foco cirúrgico: explorar as contradições nos relatórios orçamentários apresentados pelo Executivo. O objetivo tático foi demonstrar a invisibilidade das pessoas idosas na peça programática do PPA. Isso porque um programa excessivamente genérico — Planejado — acabou permitindo a dispersão de ações e atividades, que ficaram invisíveis e sem recursos orçamentários específicos para os serviços destinados à população 60+ nas diversas secretarias.
O ápice dessa mobilização permitiu uma ação estratégica, que foi a realização de uma Reunião Extraordinária do Pleno do CMI-SP, culminando na aprovação de duas Resoluções de caráter deliberativo:
- A VI Resolução: Aprovando as diretrizes resultantes da VI Conferência Nacional (etapa Municipal) dos Direitos da Pessoa Idosa, consolidando demandas coletivas.
- A VII Resolução: Definindo de forma clara o Planejamento Orçamentário da Política Municipal para a Pessoa Idosa, estruturando em Três Programas de Ações e Atividades.
Essa articulação visa um objetivo maior: criar as condições legais e orçamentárias para lutar, de forma eficaz, pela alocação de verbas para as várias Ações e Atividades dispersas, sejam as já existentes ou às serem criadas, em todas as secretarias que tangenciam o atendimento às necessidades da Pessoa Idosa de São Paulo.
Secretaria Municipal da Pessoa Idosa
Um ponto de debate levantado pela mobilização foi a complexidade da gestão intersecretarial.
Com as ações voltadas à pessoa idosa pulverizadas entre Saúde, Assistência Social, Cultura, Esportes e Lazer, surge a necessidade crescente de construir construtos de gestão para a metrificação das Ações e Atividades Transversais.
Lideranças do movimento destacaram que essa medição de impacto e efetividade só é plenamente viável por meio da criação de uma Secretaria Municipal da Pessoa Idosa. A existência de uma pasta dedicada não apenas concentraria a gestão, mas também daria o peso político e orçamentário necessário para coordenar, cobrar e monitorar as políticas públicas em todos os órgãos do governo municipal.
O movimento em São Paulo ecoa a reflexão sobre a ontogenia da política social e a importância do controle social, conforme defendem pensadores como Edgard Morin, que postula a necessidade de uma visão complexa e articulada da realidade, e Humberto Maturana, que aborda a co-construção da realidade através da linguagem e do fazer.
Ao lotarem as Audiências e apresentarem um plano orçamentário detalhado e deliberado, a sociedade civil de São Paulo demonstra que o idoso não é apenas objeto de política social, mas sim um agente político ativo. O ato de inserir as demandas do idoso “DENTRO DO ORÇAMENTO” é, em essência, um ato de desinvisibilização, uma redefinição de sua posição no contrato social da cidade e um passo fundamental para o exercício pleno de sua cidadania.
A luta, agora, entra na fase de acompanhamento da nova elaboração pelo relator Legislativo e da execução orçamentária propriamente dita, garantindo que o volume de recursos corresponda ao volume de vozes ouvidas na Câmara.