A Nova República, cujo início se deu em 1985, redemocratizou o Brasil e enterrou a ditadura civil-militar-empresarial, que durou 21 anos — 1964-1995 — e instaurou o Estado de Direito e a democracia, que completarão 40 anos em outubro. É o período democrático mais longevo do País.
Mas, vira e mexe, os militares se arrogam como “reserva moral” do Brasil e ameaçam destruir a democracia, ainda, embalado por anticomunismo tosco, que remonta à Guerra Fria — antagonismo que polarizou o mundo em 2 blocos, capitalista e socialista —, de 1947 a 1991, e opunha os EEUU a União Soviética, extinta em 1991, com o fim do chamado bloco socialista.
Qual a origem dessa mentalidade dos militares brasileiros, em particular do Exército? Isso remonta ao pós-Guerra do Paraguai — conflito armado que ocorreu entre 1864 e 1870 —, entre o Paraguai e a Tríplice Aliança, composta por Brasil, Argentina e Uruguai.
Tendo vencido a “maldita guerra”, sugestivo nome que dá título ao livro do professor Francisco Doratioto, que com sólida base metodológica e documental analisa as origens e a dinâmica militar da guerra e descobre ou recupera informações surpreendentes sobre os 6 anos dessa luta que destruiu o Paraguai e o levou à ruína. As consequências dessa guerra duram até hoje no país.
Resultado e espólio da guerra
Estima-se que 75% da população do Paraguai — algo em torno, supõe-se, de 450 mil pessoas à época — tenha morrido durante a guerra. Foi o mais sangrento conflito da América Latina.
As perdas dos países aliados foram: Brasil: cerca de 50 mil homens morreram dos cerca de 123 mil que lutaram; Uruguai: cerca de 3.100 homens feneceram dos cerca de 5.600 que foram à guerra; e Argentina: cerca de 30 mil homens ficaram no solo paraguaio. O Paraguai ficou em ruínas e perdeu parte do território para os países vencedores.
Qual a origem desse mito
Tendo retornado da guerra — liderada pelo marechal monarquista Duque de Caxias, pelo lado do Brasil, apelidado de “O Pacificador” e “O Marechal de Ferro” —, os militares do Exército, chegaram com muito prestígio, à época, e isso fez com que tivessem alimentado a ideia que eram os verdadeiros patriotas brasileiros. Sobre isso assista à aula no canal ‘Vogalizando’, no Youtube.
Sentindo-se desprestigiado pela coroa brasileira e com demandas reprimidas, mas não atendidas pela monarquia, o Exército conspirou, organizou e desferiu golpe de Estado, que redundou na fundação da república, em 15 de novembro de 1889, que vai completar 136 anos, neste 2025. Sobre o tema, quem quiser ler mais, recomenda-se o livro do jornalista e historiador Hélio Silva — O Poder Militar, de 1984.
Golpes no Brasil
Daí em diante, até os dias atuais, os militares brasileiros se arrogam ou se veem como os fiadores dos rumos e do futuro do País. Foi assim, no Golpe de Três de Novembro, como ficou conhecido na história, o golpe do presidente marechal Deodoro da Fonseca, quando dissolveu o Congresso, dia 3 de novembro de 1891.
Há, ainda, a chamada Primeira Revolta da Armada (1891) — 20 dias depois de “Golpe de Três de Novembro” —, Deodoro renunciou ao cargo, diante da reação da Marinha, que ameaçou bombardear a cidade do Rio de Janeiro, caso continuasse no cargo.
A chamada Revolução de 1930 — golpe de caráter civil-militar — encabeçada por lideranças dos estados da Paraíba, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. O protagonista dessa refrega foi Getúlio Vargas, que questionou a vitória fraudulenta do candidato da situação, Júlio Prestes, indicado como sucessor do presidente Washington Luís.
Após ter sido eleito indiretamente presidente da República, em 1934, Getúlio inaugurou o Estado Novo e teve de lidar com outros problemas. O principal foi o chamado Movimento de 1935, liderado por jovens oficiais do Exército sob inspiração da ANL (Aliança Nacional Libertadora) e a influência da Revolução Russa (1917), cujo protagonista foi o tenente Luís Carlos Prestes, que depois ingressou no PCB (Partido Comunista do Brasil). O movimento eclodiu em estados como Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Pernambuco. Mas logo foi sufocado pelas forças do governo.
A deposição de Getúlio, em 1945, que começou com golpe, em 1937, nos moldes do fascismo europeu, tendo inclusive feito com que ele se aproximasse da Alemanha Nazista, no início do Estado Novo.
E, finalmente, o Golpe de 1964, de extração fascista, conservador e nacionalista xenófobo, com apoio ostensivo dos EEUU, em razão do anticomunismo, da Doutrina Monroe — cuja consigna é a “América para os americanos” — e a divisão do mundo em “zonas de influência”, tendo os EEUU e a União Soviética, respectivamente, como líderes dos 2 blocos antagônicos erigidos no pós-2ª Guerra Mundial. Nessa divisão, o Brasil ficou sob a órbita dos EEUU.
Sobre essa divisão do mundo em zonas de influência recomenda-se, para quem desejar, a leitura do livro “Os Três Grandes”, do escritor, analista, historiador e jornalista britânico Jonathan Fenby.
Ditadura corrupta
Quem defende a ditadura militar — 1964 a 1985 —, pega, em geral, por 2 aspectos: que “não havia corrupção no Brasil”; e que País funcionava, “não havia baderna”. Na verdade, todas as mazelas brasileiras foram turbinadas pelo regime militar.
“Durante a ditadura militar, foram diversos os casos de corrupção, embora a censura e a repressão tenham dificultado a exposição das irregularidades.”
Grandes obras, como a Transamazônica, Itaipu e as usinas nucleares de Angra, foram marcadas por superfaturamento e desvios de verbas. Instituições públicas, como o BNDES e a Petrobras, também foram usadas para beneficiar aliados do regime. Concessões de rádio e TV favoreceram grupos de mídia, enquanto militares e empresários ligados ao governo criaram empresas para obter contratos fraudulentos.
A ausência de fiscalização, a censura e a centralização de poder facilitaram essas práticas, e desmente o mito de que o regime era “imune” à corrupção.
Cronologia da tentativa de golpe de Estado
E mais recentemente, a tentativa de golpe de Estado — leia a cronologia — protagonizada e liderada pelo capitão da reserva do Exército e ex-presidente da República — 2018-2022 —, cujo discurso disruptivo remonta à época em que foi eleito pela primeira vez deputado federal, em 1990.