Uma operação da Inspeção do Trabalho do MTE ocorrida entre os dias 12 e 26 de março últimos resgatou 20 trabalhadores encontrados em situação análoga à escravidão nas zonas rural e urbana das cidades de Caiçara, Serra Branca e Boa Vista, na Paraíba, e Sertânia, Alagoinha e Pedra, em Pernambuco. No total, sete estabelecimentos de diferentes setores econômicos foram fiscalizados, e em quatro deles foram constatadas condições análogas à escravidão – dois no setor de pedreiras e dois na atividade de obras de calçamento de ruas e vias.
A operação, coordenada pela Auditoria-Fiscal do Trabalho do MTE, contou com a participação do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU) e Polícia Federal (PF).
De acordo com a Inspeção do Trabalho, oito trabalhadores foram resgatados em duas pedreiras – uma em Caiçara (PB) e outra em Sertânia (PE) – em condições degradantes. A caracterização se deu pelas precárias condições de trabalho e alojamento, onde trabalhadores exerciam a função de quebradores de pedra, utilizando ferramentas manuais sem qualquer proteção, em total descumprimento das normas de segurança e saúde no trabalho, expostos a graves riscos à sua integridade física.
Dois alojamentos precários identificados foram construídos com estacas de madeira, cobertas por pedaços de lona e palha. Dentro dos barracos, não havia espaço adequado para armazenar objetos pessoais ou ferramentas. As refeições eram preparadas em fogões improvisados com pedras, sem acesso a água potável ou energia elétrica e, em um dos abrigos, os fiscais encontraram carne coberta por larvas, destinada à próxima refeição.
A água consumida era armazenada em vasilhames de agrotóxicos, cuja reutilização é proibida. Não havia instalações sanitárias nem kits de primeiros socorros para atendimento em caso de acidentes. Além disso, os trabalhadores não tinham registro em carteira, não realizavam exames médicos e não utilizavam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). Eles eram remunerados exclusivamente por produção, sem direitos trabalhistas como 13º salário, férias ou descanso remunerado. Quatro trabalhadores recebiam um valor mensal inferior ao salário-mínimo.
Outros 12 trabalhadores resgatados atuavam na pavimentação de ruas e calçadas para empresas contratadas pelos municípios. Seis estavam em Serra Branca (PB), dois em Alagoinha (PE) e quatro em Pedra (PE). Nenhum deles tinha registro em carteira de trabalho e realizavam suas atividades sem EPIs, colocando a saúde e a segurança em risco. Além disso, não havia fornecimento de água potável nem banheiros no local da obra. Os alojamentos, alugados pelas empresas prestadoras de serviço, também apresentavam condições inadequadas. Os trabalhadores dormiam em colchões no chão, alguns sem qualquer proteção, improvisando camas com tijolos. Cozinhavam e faziam as refeições no mesmo ambiente onde dormiam, sem estrutura adequada de higiene e segurança. Os alojamentos não eram higienizados e os pertences dos trabalhadores ficavam misturados aos mantimentos. No local não havia filtros, sendo a água disponível turva, retirada diretamente da rua e utilizada para banho. Os sanitários estavam inoperantes, devido à falta de água para descarga.
Obras públicas
Segundo informou a fiscalização, uma das obras foi contratada pela administração municipal de Alagoinha (PE) e outra pela Companhia Estadual de Habitação e Obras de Pernambuco (CEHAB). A Administração Pública, ressaltou os fiscais que participaram da ação, tem o dever legal e moral de garantir que os serviços contratados respeitem os direitos trabalhistas e o não cumprimento da legislação trabalhista, contribuiu para a precarização da mão de obra, alertando que a contratação de empresas por valores incompatíveis com os custos necessários para a observância das normas trabalhistas, favorece a informalidade e a exploração.
Ações fiscais e regularização
A coordenadora da operação, auditora-fiscal do Trabalho, Gislene Stacholski, informou que os responsáveis pelas contratações foram notificados para regularizar os vínculos trabalhistas, quitar as verbas rescisórias e recolher o FGTS e as contribuições sociais. Até o momento, cerca de R$ 80 mil foram pagos aos trabalhadores resgatados, de um total de R$ 100 mil devidos.
Os trabalhadores resgatados têm direito a três parcelas do seguro-desemprego especial, sendo encaminhados aos órgãos municipais e estaduais de assistência social para atendimento prioritário. Esta ação integra o esforço contínuo do MTE, por meio da Inspeção do Trabalho, em combater e erradicar o trabalho escravo no Brasil, garantindo condições dignas de trabalho e vida para todos os trabalhadores.
Foram firmados também Termos de Ajuste de Conduta (TACs) junto ao MPT e à DPU, prevendo o pagamento de indenizações por danos morais individuais aos trabalhadores resgatados. Durante a operação, um total de 38 trabalhadores tiveram seus direitos trabalhistas garantidos, pois estavam sem registro em Carteira de Trabalho.
Informações e denúncias
Os dados oficiais das ações de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil estão disponíveis no Radar do Trabalho Escravo da SIT e as Denúncias podem ser feitas, de forma anônima, pelo Sistema Ipê.