A abertura da Comissão Normativa sobre Trabalho Decente na Economia das Plataformas nesta terça-feira (3), durante a 113ª Conferência Internacional do Trabalho da OIT, deixou claro o contraste entre a defesa de direitos e o avanço da precarização. Brasil e União Europeia uniram forças para propor um marco global que garanta condições dignas para trabalhadores de aplicativos, enquanto Argentina, Estados Unidos e outros países insistiram em posições que favorecem a desregulamentação e a flexibilização das normas trabalhistas.
“A defesa dos trabalhadores em plataformas não pode ser moeda de troca para governos radicais como os de Trump e Milei, que ameaçam a dignidade e o progresso. Os países latino-americanos, junto com a União Europeia, reafirma seu compromisso com a justiça social e o diálogo tripartite”, destacou Antonio Neto, presidente da CSB e representante brasileiro na comissão ao lado de Fábio Bon Tibiriçá (CUT).
A Comissão será presidida pelo advogado e subsecretário do trabalho filipino Benedicto Ernesto R. Bitonio Jr., eleito pelos membros, e conta também com Eva Staworzynska (EUA) como vice-presidente da bancada patronal e Amanda Brown (Reino Unido), vice-secretária-geral do maior sindicato de educação britânico (NEU), eleita pela bancada dos trabalhadores.
Amanda fez uma defesa firme dos direitos trabalhistas, contrapondo a visão patronal. “Os algoritmos não são neutros. Não é a automatização do trabalho, mas da precariedade. Precisamos impedir as camuflagens digitais da exploração.”
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A representante patronal, Eva Staworzynska, defendeu uma recomendação flexível e não vinculante, argumentando que as plataformas apenas “intermediam oferta e demanda”.
Em seguida, os blocos e países se posicionaram na abertura dos trabalhos. O México apresentou sua nova legislação pioneira, que entrará em vigor ainda este mês e garantirá direitos a cerca de 700 mil trabalhadores de plataformas. O governo mexicano também defendeu, em conjunto com Brasil, Chile, Cuba e Uruguai, a criação de uma Convenção Internacional que estabeleça direitos básicos para esses trabalhadores em todo o mundo.
Entre os países que se alinharam à posição de uma Convenção vinculante com recomendação estiveram União Europeia (representada pela Polônia e reforçada por Espanha, Dinamarca, Noruega e Reino Unido), Austrália, Costa Rica, Kenya, Costa do Marfim, Namíbia (representando a África), e organizações como a Santa Sé (Vaticano), representantes de empregadas domésticas, cooperativismo, juventude operária e federação internacional de transportes.
Já Omã, Bangladesh, Indonésia, China, Índia, Argentina e EUA defenderam apenas uma recomendação não vinculante, com discursos centrados na defesa da “inovação” e da “flexibilidade” do modelo.
O representante da União Europeia destacou que a defesa do trabalho decente é central para o futuro do trabalho, cobrando mais transparência dos algoritmos e garantias de direitos como sindicalização e negociação coletiva. A Noruega, os países nórdicos, a Espanha e o México reforçaram que o avanço tecnológico não pode justificar um retorno a condições de trabalho do século XIX.
A representante da OIT, Manuela Tomei, explicou que esta é a primeira fase de uma discussão que se estenderá até a 114ª Conferência, em 2026. Ela destacou os graves problemas enfrentados pelos trabalhadores em plataformas digitais e a necessidade urgente de uma resposta normativa internacional.
A sessão também contou com a presença do diretor-geral da OIT, Gilbert Houngbo. O governo brasileiro é representado pelo Secretário de Economia Solidária do Ministério do Trabalho, Gilberto Carvalho, ex-ministro e com histórica militância junto ao movimento sindical, e pela assessora especial de Assuntos Internacionais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Maíra Lacerda e Silva.
Os trabalhadores brasileiros serão representados por Antonio Neto e Fábio Bon Tibiriçá, reafirmando a posição da bancada brasileira em favor de uma Convenção vinculante e de normas que garantam proteção social, segurança e dignidade a todos os trabalhadores.
“Não podemos permitir que modelos desumanos e exploratórios se espalhem pelo mundo. É preciso seguir o exemplo da Espanha e do México para proteger o presente e o futuro do trabalho”, concluiu Antonio Neto.