Notícia - Sindicalismo classista e o antifascismo se unem na Federação Sindical Mundial

Por Cameron Harrison

A reeleição de Donald Trump e o ressurgimento do fascismo em nível internacional intensificaram as ameaças aos direitos dos trabalhadores, às instituições democráticas e ao progresso social. Movimentos fascistas estão explorando a insegurança econômica e as ansiedades culturais, promovendo a xenofobia, o nacionalismo, o racismo e o sexismo, para avançar os interesses do capital monopolista e de seus bilionários apoiadores.

Neste contexto, a histórica Federação Sindical Mundial (FSM) permanece como uma força vital para a solidariedade internacional da classe trabalhadora, oferecendo um modelo para resistir ao fascismo e defender os direitos dos trabalhadores no século XXI.

Em março a FSM realizou sua reunião do Conselho Presidencial de 2025 em Hanói, Vietnã. Os delegados focaram na situação atual da classe trabalhadora internacional, analisaram a crescente influência do fascismo e enfatizaram a necessidade de uma educação sindical e ideológica mais sólida, fortalecimento dos escritórios setoriais e regionais, além de mais apoio à juventude e às mulheres trabalhadoras.

Oitenta anos após sua fundação, a FSM continua lutando pelos direitos dos trabalhadores ao redor do mundo, incluindo refugiados, migrantes, mulheres e grupos marginalizados. Ela continua a defender a luta contra o racismo, a xenofobia e o fascismo – batalhas que, ao longo de sua longa história, sempre foram centrais à sua identidade.

Trabalhadores contra o fascismo

Na década de 1930, regimes fascistas procuraram eliminar o poder do trabalho organizado, vendo os sindicatos como uma ameaça ao seu governo aberto e terrorista. Ao suprimir greves, proibir a negociação coletiva e substituir sindicatos independentes por organizações controladas pelo Estado ou pelas corporações, os governos fascistas tentaram minar a capacidade dos trabalhadores de defender seus direitos e melhorar suas condições.

Além disso, a ascensão do fascismo representou uma ameaça mais ampla à democracia, com instituições representativas sendo abolidas, a oposição política reprimida e ditaduras dos elementos mais reacionários do capital sendo estabelecidas em diversos países.

O movimento sindical internacional reconheceu a ameaça e clamou por unidade e resistência. O 7º Congresso Mundial da Internacional Comunista, em 1935, liderado por Georgi Dimitrov, enfatizou a necessidade de uma frente unida contra o fascismo, reunindo comunistas, socialistas e liberais em uma luta comum.

Foi essa luta e a subsequente guerra mundial contra o fascismo que lançaram as bases para a formação da FSM em 1945. Seu objetivo era unir trabalhadores através de linhas ideológicas e nacionais, tendo como bandeiras a paz, a democracia e a justiça social.

Fundação da FSM

A conferência inaugural da FSM, realizada em Londres, foi um momento chave na história do movimento sindical global. Participaram 204 delegados, representando 50 milhões de trabalhadores de 40 sindicatos, nacionais e 15 internacionais, reunindo uma coalizão diversa de trabalhadores unidos por um objetivo comum: defender os direitos trabalhistas e impedir o retorno do fascismo.

A federação uniu sindicalistas de diferentes origens políticas e ideológicas, incluindo comunistas, socialistas e democratas de várias correntes, para combater os inimigos comuns do fascismo e do poder corporativo.

O Conselho Central dos Sindicatos da União Soviética (AUCCTU) desempenhou um papel fundamental na fundação da FSM, mas a organização nunca foi exclusivamente comunista. Por exemplo, o Congresso de Organizações Industriais (CIO), dos EUA, e o Trades Union Congress (TUC), do Reino Unido, também foram membros fundadores.

Desde o início, porém, a FSM enfrentou divisões ideológicas, com duas facções principais emergindo. Alguns líderes sindicais dos EUA e de alguns países da Europa Ocidental desejavam continuar o modelo da antiga Internacional de Amsterdã, a Federação Internacional dos Sindicatos (IFTS), ligada aos partidos social-democratas europeus e voltada principalmente para questões salariais e de bem-estar. Outro grupo de trabalhadores, composto por comunistas, socialistas, democratas e progressistas (incluindo representantes da URSS, China e América Latina), queria que a FSM fosse um instrumento da luta de classes e do internacionalismo proletário.

As questões da autodeterminação dos povos oprimidos e do colonialismo também dividiam as duas facções. Enquanto os comunistas defendiam os direitos dos trabalhadores não apenas nos países industrializados, mas também nas nações colonizadas e semi-colonizadas, os sindicatos mais conservadores estavam focados em ganhos imediatos dentro de suas próprias fronteiras.

No Primeiro Congresso Mundial, em Paris, em 1945, foi decidido fundar a Federação Sindical Mundial como uma organização unificada e inclusiva, capaz de enfrentar os desafios da reconstrução pós-guerra e defender os direitos trabalhistas em escala internacional. A antiga IFTS foi considerada inadequada para atender às novas exigências de um mundo em rápida transformação, especialmente com o aumento da influência dos sindicatos socialistas e comunistas. A Internacional de Amsterdã foi então formalmente dissolvida.

A FSM assumiu imediatamente um papel fundamental na defesa dos direitos dos trabalhadores nas recém-criadas Nações Unidas e suas agências especializadas, notadamente a Organização Internacional do Trabalho (OIT). A federação defendeu ativamente a inclusão dos direitos dos trabalhadores nos acordos internacionais e usou sua influência para garantir que a classe trabalhadora fosse priorizada nas decisões importantes da ONU.

Unidade do pós-guerra dá lugar à divisão

Segunda Guerra Mundial devastou a Europa, a Ásia e outras regiões, abandonando infraestruturas, indústrias e economias em ruínas. Reconhecendo a urgência da reconstrução, a FSM priorizou os direitos dos trabalhadores e defendeu uma recuperação econômica justa. A federação também apoiou os movimentos de libertação nacional na Ásia, África e América Latina, enxergando-os como parte integrante da luta contra as forças que haviam fomentado o fascismo.

Entretanto, as pressões internas aumentaram, com figuras como Arthur Deakin, do TUC britânico, pedindo a dissolução da FSM, afirmando que ela era “controlada pelos comunistas”.

O Segundo Congresso Mundial, em 1949, na Itália, reuniu delegados de 61 nações, representando 71 milhões de trabalhadores. O congresso abordou as crescentes tensões da Guerra Fria, celebrou vitórias de movimentos revolucionários na China, Coreia e Vietnã, e reavaliou o panorama global após a derrota do fascismo internacional.

As crescentes tensões entre os EUA e a URSS aprofundaram ainda mais as divisões internas da FSM. A oposição da federação ao Plano Marshall se baseava na visão de que era um instrumento do imperialismo estadunidense que ameaçava os direitos dos trabalhadores e os movimentos socialistas. A FSM argumentava que o plano priorizava os interesses das corporações e impunha medidas de austeridade prejudiciais aos padrões de vida.

A FSM também viu corretamente o plano como uma tentativa de minar movimentos socialistas e comunistas na Europa, especialmente em países como França e Itália, onde esses movimentos eram fortes.

Divisões da Guerra Fria e os expurgos do macartismo

Os expurgos anticomunistas dos anos 1940 e 50, especialmente nos EUA, tiveram um impacto devastador no movimento sindical. Sob o pretexto de combater o comunismo, líderes sindicais militantes foram presos e substituídos por figuras pró-capitalistas alinhadas à política externa dos EUA e à OTAN.

Doutrina Truman, anunciada em 1947, enquadrou a Guerra Fria como uma luta entre “democracia” e “totalitarismo”, influenciando fortemente a política interna dos EUA. Isso desencadeou perseguições contra a “influência comunista”, especialmente nos sindicatos.

macartismo e o medo vermelho atingiram seus objetivos: enfraquecer a influência da esquerda e reconfigurar o movimento sindical para alinhar-se à política externa dos EUA. Líderes sindicais foram pressionados a apoiar a OTAN e a se opor aos movimentos socialistas ou comunistas no exterior.

Muitos líderes sindicalistas expulsos – vários deles, mas não todos, ligados ao Partido Comunista dos EUA – haviam sido fundamentais na organização de trabalhadores industriais e na conquista de direitos como o Seguro Social. Sindicatos como o United Electrical Workers (UE) foram particularmente atacados por sua oposição à Guerra Fria.

Entre 1949 e 1950, o CIO expulsou 11 sindicatos de tendência esquerdista, representando mais de um milhão de trabalhadores. Eles foram acusados de serem “dominados por comunistas”, embora muitos fossem simplesmente progressistas e combativos.

A Lei Taft-Hartley de 1947 exigia que líderes sindicais declarassem que não eram membros do Partido Comunista, barrando-os de cargos de liderança. Sindicatos que se recusaram, como o UE, foram expulsos do CIO e perderam apoio.

Esses expurgos custaram ao movimento trabalhista alguns de seus mais talentosos e combativos organizadores.

A divisão também afetou a FSM, com sindicatos do Reino Unido, Alemanha Ocidental, França, Canadá, Itália e partes da Ásia se retirando. Na França, o governo proibiu os escritórios centrais da FSM, que se mudaram para Viena.

A Federação Americana do Trabalho (AFL) aproveitou a divisão para formar, em 1949, a Confederação Internacional de Sindicatos Livres (ICFTU), com 35 milhões de trabalhadores, principalmente da Europa e América do Norte, se posicionando como uma alternativa “livre” à FSM, rotulada como “controlada pelos comunistas”.

Seguindo em frente

Apesar das divisões e ataques da Guerra Fria, a FSM continuou se posicionando como defensora dos direitos dos trabalhadores, do anti-imperialismo e do socialismo. Embora tenha sido marginalizada em países capitalistas desenvolvidos, permaneceu uma força relevante no mundo em desenvolvimento, apoiando movimentos anticoloniais e promovendo a solidariedade internacional dos trabalhadores.

A FSM também promoveu a igualdade de gênero, defendendo salários iguais, licença maternidade, apoio à creche, e os direitos de trabalhadores migrantes e grupos oprimidos.

A luta pela paz mundial sempre foi marca registrada da FSM. Ela participou do movimento global pela paz, pela não proliferação nuclear e contra alianças militares como a OTAN. Enxergava o militarismo como algo que sacrificava os trabalhadores para que os imperialistas lucrassem.

A FSM foi crítica das intervenções dos EUA na Coreia, Vietnã e Cuba, e dos regimes fascistas apoiados pelos EUA na América Latina.

Seus programas de intercâmbio entre sindicalistas de países capitalistas e socialistas permitiram contato direto entre trabalhadores, fortalecendo o compromisso com a justiça social. Os participantes testemunhavam avanços como pleno emprego, habitação, segurança social e educação gratuita.

Crise e renovação

As contrarrevoluções que derrubaram o socialismo na Europa Oriental e na URSS, entre 1989 e 1991, deixaram o movimento comunista e progressista internacional em desordem. Muitos sindicatos entraram em crise, e a base ideológica do movimento sindical foi abalada.

Algumas federações, como a CGT (França) e a CGIL (Itália), defenderam a dissolução da FSM. Mas sindicatos de Cuba, Índia e África se opuseram fortemente. Apesar da confusão, houve esforços para fortalecer a organização e promover a solidariedade.

A FSM apoiou a luta contra o apartheid na África do Sul, trabalhando com a COSATU e outras forças progressistas. Organizou campanhas de boicote e sanções, contribuindo para o fim do regime racista.

Nos anos 2000, muitos sindicatos dos antigos países socialistas deixaram a FSM e se juntaram à ICFTU. A sede da FSM foi transferida para a Grécia. Em 2001, a ICFTU apoiou a invasão do Iraque pelos EUA, o que enfraqueceu sua já frágil unidade.

Em 2006, a ICFTU se dissolveu e deu lugar à Confederação Sindical Internacional (ITUC), após fusão com a Confederação Mundial do Trabalho (WCL). A ITUC tentou focar em questões práticas dos trabalhadores, como salários e segurança no trabalho.

Hoje, muitos sindicatos são filiados tanto à FSM quanto à ITUC. Mas essa dupla filiação é desafiadora, já que a FSM enfatiza a luta de classes e o anti-imperialismo, enquanto a ITUC tem um foco mais limitado.

A FSM no século XXI

Apesar dos desafios, a FSM permanece uma força formidável. Sua dedicação à solidariedade da classe trabalhadora internacional e ao antifascismo continua tão relevante quanto em sua fundação.

Desde o 15º Congresso em Havana, em 2005, a federação tem se concentrado em revitalização, mantendo vivas as tradições de sindicalismo classista, democracia sindical, luta contra a exploração, pela paz mundial e solidariedade internacional.

A FSM é uma firme defensora do movimento sindical cubano, sobretudo diante do bloqueio econômico dos EUA. Também é uma voz ativa em defesa dos trabalhadores palestinos, apoiando a organização sindical na Cisjordânia e Gaza, condenando a ocupação e incentivando boicotes a empresas cúmplices da ocupação israelense.

A história da FSM reflete as lutas políticas e ideológicas mais amplas do movimento sindical internacional. Mas não está presa ao passado. Desde suas raízes antifascistas até sua resiliência na Guerra Fria e além, a FSM tem sido uma campeã dos direitos dos trabalhadores e dos oprimidos. Apesar dos desafios, seu legado como força progressista e militante no sindicalismo internacional continua vivo.

Cameron Harrison é ativista sindical e organizador da Comissão Trabalhista do Partido Comunista dos EUA (CPUSA).

Texto traduzido do Peoples World por Luciana Cristina Ruy


Fonte:  Rádio Peão Brasil - 29/04/2025


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